Cinema Sustentável – Negócio de família pode ter dimensão social

Cinema Sustentável – Negócio de família pode ter dimensão social

Por Sérgio Rizzo

Filmes voltados para a conquista de grandes plateias percorrem sempre uma via de mão dupla em direção ao mundo que representam em suas tramas.

Ao mesmo tempo em que se alimentam do que a sociedade faz e pensa, ajudam a pautar o que essa mesma sociedade fará e pensará, em processo de retroalimentação que muitas vezes dificulta saber se, primeiro, veio o ovo ou a galinha.

O público adota novos comportamentos por causa das representações ficcionais do cinema (e da TV) ou essas representações ficcionais nascem de novos comportamentos sociais? Tudo ao mesmo tempo agora, como diriam os Titãs.

No campo dos temas de sustentabilidade, é muito revelador, como já escrevi neste espaço, que uma superprodução de espionagem e aventura como 007 – Quantum of Solace (2008) traga o imbatível agente secreto James Bond (agora interpretado pelo inglês Daniel Craig) lutando para desmascarar um empresário “verde” (o francês Mathieu Amalric) que, na verdade, usa essa fachada para fazer negócios escusos – alguns dos quais, paradoxalmente, dilapidam o meio ambiente.

Não deixa de ser positivo que o assunto chegue até mesmo ao universo de diversão (supostamente descompromissada) de Bond, mas há algo circulando pela sociedade – e o cinema para consumo de massas sabe muito bem traduzir essas percepções – sobre empresários “verdes” que por dentro seriam… “laranjas”.

Algumas transformações podem ser identificadas nas entrelinhas de histórias que não sugerem estar diretamente relacionadas a temas de sustentabilidade. Prestemos um pouco mais de atenção, por exemplo, ao drama norte-americano Os Descendentes, já disponível em DVD e Blu-Ray no Brasil. Vencedor do Oscar de roteiro adaptado, o filme se baseia em romance de Kaui Hart Hemmings sobre a dor de um marido (George Clooney) que, com a mulher em coma no hospital, descobre que vinha sendo traído por ela.

Além de lidar com essa situação e com a necessidade de se reaproximar das duas filhas, ele negocia, em nome da numerosa família, um terreno em uma das ilhas do Havaí, herança de antepassados que agora corresponde a uma fortuna. Os potenciais compradores querem construir ali um hotel de luxo.

Em primeiro plano, o diretor e roteirista Alexander Payne (Eleição e Sideways – Entre Umas e Outras) aborda os apuros domésticos e íntimos do marido. Ganha importância crescente, no entanto, o dilema em torno do que fazer com a propriedade. Há razões sentimentais em jogo, bem como o desejo de fazer dinheiro com a venda, mas a preocupação ambiental entra em cena para atribuir a um negócio de família uma importância social, que inclui na pauta a dimensão da sustentabilidade.

Não cabe aqui revelar o desfecho, claro, mas convém lembrar que, em outros tempos, ele provavelmente seria outro. Talvez nem mesmo houvesse reflexão, na trama, sobre o destino mais adequado para o terreno e, consequentemente, para a comunidade. A percepção sobre o tema mudou, no entanto, e o cinema vem a reboque. Ou seria no comando?

Sérgio Rizzo é jornalista, crítico de cinema e professor

www.sergiorizzo.com.br

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