Especial – Educação e Inovação para a Sustentabilidade (parte 3)

Especial – Educação e Inovação para a Sustentabilidade (parte 3)

Educação e Inovação para a Sustentabilidade
Novo perfil profissional
O contrário do passado, quando o universo das conexões corporativas era, a rigor, o seu próprio umbigo, as empresas de hoje orbitam em torno de uma rede de relacionamentos muito mais diversa. Até menos de duas décadas, os públicos de interesse de uma corporação podiam ser contados nos dedos de uma mão. Hoje, além de funcionários, fornecedores, e clientes, entraram no jogo comunidades, investidores pequenos e médios, lideranças comunitárias, governos, organizações não-governamentais, formadores de opinião, grupos de pressão locais e nacionais e até mesmo indivíduos mais atentos e dispostos a disseminar suas eventuais insatisfações pela Internet.
Uma complexa rede de relacionamentos como esta pode ser regida de modo a estabelecer benefícios comuns. Mas não se trata de uma tarefa nem simples nem fácil. Requer, além de uma nova forma de gestão, mais transparente e atenta, um time de profissionais preparados para escutar, filtrar e incorporar os pontos de vista das partes interessadas na maneira de pensar e fazer negócios. Este é o preço que se tem que pagar por ser empresa no século 21.
Nos últimos dois anos, a Aracruz tem centrado esforços no treinamento de funcionários para o relacionamento com a sociedade. “Como a Aracruz é uma empresa florestal com unidades distribuídas em mais de 120 municípios, os profissionais da empresa se relacionam com diferentes tipos de comunidade. Por isso, é importante que desenvolvam a habilidade de construir pontes entre a empresa e a sociedade em diferentes situações”, afirma Carlos Alberto Roxo, diretor de sustentabilidade da Aracruz.

A empresa também tem buscado profissionais com essa competência no mercado. Segundo Roxo, a formação não é o fator mais importante no processo de seleção, mas sim as experiências que o profissional acumulou ao longo de sua trajetória. Para exemplificar, ele conta um exemplo registrado em seu próprio departamento. “Demoramos seis meses para contratar um gerente de sustentabilidade. Só depois fui descobrir que era jornalista. A experiência que ele acumulou por meio de projetos realizados na Amazônia e junto a órgãos governamentais foi determinante para a sua contratação. Além de sólida formação, buscamos profissionais que não sejam apenas resolvedores de problemas, mas capazes de encontrar respostas a partir do relacionamento com diferentes stakeholders”, ressalta.
Carlos Alberto Roxo – diretor de sustentabilidade da Aracruz
Entender a realidade do outro não é tarefa fácil e demanda, segundo Jansen da DuPont, a ruptura de paradigmas. “O profissional precisa ter a predisposição para entender a fundo a dinâmica das diferentes partes interessadas, além de iniciativa para vivenciar a realidade do outro. Não adiante ler um monte de coisas. É preciso estar lá, conversar e escutar”, explica.
Jansen destaca ainda o espírito empreendedor como competência essencial do profissional para fazer conexões entre as soluções criadas e as necessidades da sociedade. “É interessante observar que o tipo de profissional que se dá melhor nessa área, normalmente, desenvolveu a inteligência emocional, o lado esquerdo do cérebro, área à qual as instituições de ensino não têm se dedicado muito”, completa.
Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP), Rodrigo Rocha Loures reforça que a inovação social é uma competência a ser desenvolvida. “A inovação voltada para a sustentabilidade depende de habilidades pessoais, como, por exemplo, a de aprender a aprender, aprender a entender, a se relacionar, a fazer coisas em conjunto, conhecer a si próprio e ter a compreensão do contexto onde se situa. O desafio seguinte é transformar esses conhecimentos em produtos e serviços sustentáveis”, aposta.
Cooperação para a sustentabilidade

Construir um ambiente favorável à inovação socioambiental, como pregam os defensores da Teoria U, requer um modelo sistêmico de gestão e uma construção coletiva dos conhecimentos que levam a serviços e produtos. Esse é um desafio e tanto para as empresas, normalmente muito fragmentadas em sua gestão. Para conseguir atender a demandas específicas do mercado, elas se acostumaram a dividir suas estruturas em unidades de negócios e departamentos, com rotinas muito distintas e independentes, o que, na prática, dificulta esforços de integração e possíveis sinergias. Regra geral, são ainda orientadas por processos de planejamento autoritário, excessivamente verticalizados, pouco ou nada participativos
Para explorar novas oportunidades de negócios segundo a perspectiva da sustentabilidade, a DuPont reúne funcionários das mais variadas áreas, níveis hierárquicos e países em encontros anuais para discussão de projetos. Segundo Jansen, um júri composto por convidados internos e externos seleciona cerca de 100 idéias. As propostas são avaliadas com base nos benefícios gerados para a sociedade em termos ambientais e sociais, assim como nas necessidades do mercado. De cinco finalistas, um projeto é escolhido para ser adotado pela empresa.
Foi justamente da experiência de geração coletiva de idéias que surgiu uma das mais interessantes e recentes soluções de negócio da empresa. Trata-se da SoleCina, elaborada a partir da combinação da proteína vegetal da soja com diferentes tipos de carne. Segundo Jansen, o produto foi criado após a identificação de uma necessidade da população mexicana da base da pirâmide, para a qual os altos preços da proteína animal inviabilizavam o consumo desse item essencial na alimentação Além de ser até 40% mais barata do que a proteína animal, a SoleCina, fabricada em parceria com a Solae Company, possibilita o desenvolvimento de produtos com menos gordura, calorias e sem colesterol.
A Braskem, por sua vez, apostou na criação de um banco de idéias para receber sugestões de projetos. Criado em 2004, o Programa de Inovação Braskem (PIB) conta com um software para auxiliar na avaliação das propostas. Com base em informações técnicas e comerciais, o sistema calcula a possibilidade de a sugestão ser transformada em produtos e serviços para o mercado. Segundo Luiz Fernando Cassinelli,
Ernesto Heinzelman, presidente da Embraco
diretor de inovação da Braskem, a empresa investe cerca de US$ 50 milhões por ano em pesquisa e desenvolvimento. Atualmente, são 75 os projetos em andamento nascidos no PIB. Outras 250 idéias aguardam seu lugar nesse portfólio verde. A estimativa para 2008 é que cada real investido em inovação proporcione um retorno 4,2 vezes maior. A sustentabilidade, como se vê, abre oportunidades de novos negócios e lucros consistentes e mensuráveis.
A ponte entre a teoria e a prática
Outro caminho para o desenvolvimento de novas soluções se dá a partir de parcerias com universidades. Recentemente, a empresa lançou o primeiro polietileno verde produzido com o uso da cana-de-açúcar em substituição à nafta, derivada do petróleo. A descoberta contou com o apoio de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. “É preciso buscar o conhecimento onde ele está, principalmente nos casos em que são muito específicos. A open innovation oferece essa possibilidade de troca de informações não só com universidades, mas também com outras empresas que não concorrem no mesmo mercado. A principal vantagem é a divisão dos custos da pesquisa”, afirma Cassinelli. Este modelo de cooperação permite que empresas comprem ou licenciem processos de inovação (como patentes) de outras organizações.
Segundo Jansen, da DuPont, a inflexibilidade das universidades em relação a propriedade intelectual dificulta o avanço dessa modalidade de pesquisa no Brasil. “Hoje em dia a inovação fica cada vez mais cara. Normalmente, a cada mil idéias, 100 são efetivamente transformadas em projetos, 10 conseguem atingir a fase de testes e apenas uma chega ao mercado. A colaboração entre empresas e universidades dilui os riscos e aumenta as chances de sucesso da inovação. No entanto é preciso assegurar o retorno financeiro para as empresas. Os resultados da inovação que vingou precisam compensar todo o investimento destinado às outras 1000 malsucedidas. As universidades brasileiras resistem em ceder a patente ainda que 100% do seu desenvolvimento tenha sido financiado pela empresa “, exemplifica Jansen.
A Embraco, por sua vez, mantém parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) desde 1982, por meio de convênios de pesquisa que se renovam periodicamente. A primeira grande conquista da mais longa união entre iniciativa privada e academia de que se tem notícia no País foi a fabricação, em 1987, do primeiro compressor com tecnologia 100% nacional.
Dois anos mais tarde, a Embraco começou a produzir compressores com gases alternativos ao CFC (clorofluorcarbono), como o HFC (hidrofluorcarbono). Segundo o presidente da empresa, Ernesto Heinzelmann, esse foi um marco no desenvolvimento de produtos com impactos reduzidos ao meio ambiente, algo que, com o passar do tempo, tornou-se um diferencial competitivo para a empresa.
“Quando em meados da década de 80, descobriram os efeitos do CFC para a camada de ozônio, iniciou-se uma corrida por substitutos para esse gás. A Embraco foi ganhando espaço no mercado por ter desenvolvido soluções a base de gases substitutos e compressores que demandam menor consumo de energia. A consciência da magnitude disso que fizemos só veio com o decorrer do tempo, na medida em que as questões ambientais ganharam maior visibilidade no mundo inteiro”, ressalta.
O portfólio verde de produtos da Embraco conta ainda com soluções como o compressor a base de CO2 em substituição ao HFC, que. embora menos danoso para a camada de ozônio que o CFC, lança poluentes para a atmosfera em seu processo de produção. A eficiência energética dos compressores é outro desafio ao qual a empresa tem se dedicado. Em 1996, a Embraco lançou o compressor de capacidade variável (VCC). Equipado com um controle eletrônico capaz de perceber a variação de temperatura interna do refrigerador e ajustar a geração de frio adequadamente, o produto proporciona até 40% de redução no consumo de energia.
Com 768 cartas-patentes concedidas em âmbito mundial, a Embraco aplica até 3% do faturamento líquido anual no custeio de pesquisa e desenvolvimento, mantendo, nessa área, cerca de 400 profissionais em todo o mundo. “A inovação depende de persistência e firmeza de propósito, pois decorre de um processo longo de amadurecimento da empresa. É importante investir continuamente tanto em pesquisa e desenvolvimento como na formação e seleção de profissionais com conhecimento diferenciado no mercado”, ressalta Heinzelmann.
De dentro pra fora
Pioneiro na capacitação de seu corpo de funcionários com a criação das “Oficinas de sustentabilidade” em 1991, o Banco ABN Anro Real também inovou ao levar a experiência obtida a partir da vivência desse conceito na empresa a clientes e parceiros de negócio.
O programa “Práticas em sustentabilidade” teve início em 2001 com a realização de workshops sobre o tema com fornecedores para troca de informações e experiências. Hoje, o banco também disponibiliza um endereço na internet para ampliar o alcance com o público externo. O blog Práticas disponibiliza o acesso a um banco de iniciativas de implementação da sustentabilidade, uma biblioteca com documentos de referência e cursos online.
O Real apostou na troca de experiências e informações para construção conjunta de conhecimentos, reconhecendo a importância da colaboração na economia contemporânea. “Os indivíduos têm que ser protagonistas, o que pressupõe olhar para o novo, reconhecendo que não sabemos tudo e temos muito a aprender. Podemos não ter todas as repostas, mas não temos medo das perguntas”, afirma Carla Bardaro, superintendente de desenvolvimento sustentável do Banco ABN Anro Real.

Inscreva-se em nossa newsletter e
receba tudo em primeira mão

Conteúdos relacionados

Entre em contato
1
Posso ajudar?