Rio+20, a hora da transição

Rio+20, a hora da transição

Por Sávio de Tarso

Diz o senso comum que é na crise que estão as melhores oportunidades. E o mundo parece estar diante do momento histórico ideal para confirmar a tese. A Rio+20, Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, será composta de um conjunto de eventos de escala planetária, entre os dias 11 e 26 de junho, no Rio de Janeiro. Sem dúvida, uma imensa oportunidade para influenciar decisivamente as lideranças políticas e empresariais na direção da sustentabilidade como solução para a crise sistêmica da economia global.

Compromissos entre os países para atenuar os impactos socioambientais da atividade econômica vêm sendo construídos lentamente pelo menos desde a Conferência de Estocolmo, que já em 1972 diagnosticou as falhas dos modelos de desenvolvimento que não consideravam as limitações do meio ambiente. Agora, 40 anos depois, um mundo transformado social, política e economicamente soa o alarme de urgência e demanda soluções concretas, aplicáveis no dia a dia, não mais como promessas cuja realização se pode postergar.

Nesse cenário, as empresas surgem como protagonistas do enredo de aproveitamento das oportunidades, porque podem cumprir com dinamismo o mandamento máximo da inovação – de tecnologias, processos, produtos, serviços e relações – que viabiliza a transição para um modelo de desenvolvimento capaz de reduzir as desigualdades sociais e o consumo de recursos naturais.

A Rio+20 é uma reunião de países convocada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para debater o desenvolvimento sustentável à luz dos acordos, princípios, declarações e convenções firmados ou implementados a partir da Rio-92, a Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 20 anos atrás. A dinâmica da Conferência prevê participação direta apenas das representações diplomáticas dos países, mas o processo de negociação de novos acordos incluiu consultas dos governos a todas as instâncias das sociedades locais para a proposição de temas e mecanismos de implementação que vão figurar nos documentos a serem debatidos pelos chefes de Estado.

Individualmente ou representadas por associações, as empresas brasileiras apresentaram visões e propostas às comissões de consulta organizadas por diversos órgãos do governo, capitaneados pelos Ministérios do Meio Ambiente e das Relações Exteriores.

A discussão do desenvolvimento sustentável tem de partir da viabilidade econômica. E, para partir da viabilidade econômica, a proposta tem de vir dos empresários” – disse a Ideia Sustentável o embaixador André Correa do Lago, negociador-chefe do Ministério das Relações Exteriores para a Rio+20. “Não adianta ter um modelo utópico que não se pode seguir. Podemos, sim, ter uma visão utópica para daqui a 20 anos, que vamos ajustar aos poucos. Mas essa visão tem de partir já com chances de chegar. E nisso o empresariado exerce um papel-chave.”

Longo Prazo

A possibilidade de construção desse novo modelo levou o secretário geral das Nações Unidas a exortar diretamente os empresários para que participem ativamente de todo o processo.

A Rio+20 oferece uma tremenda chance de expandir as oportunidades econômicas, fortalecer a igualdade e proteger o meio ambiente” – disse Ban Ki-moon em fevereiro, numa cúpula de investidores em Nova Iorque. “Mas, para se obter o máximo benefício deste momento, precisamos de investidores globais com visão de longo prazo, que apostem na prosperidade sustentável.”

“Longo prazo” é uma expressão que, na opinião do embaixador Correa do Lago, pode catalisar interesses no mundo dos negócios. “Sobretudo em setores mais complexos, como energia e agricultura, é algo que agrada o empresariado, que tem sofrido muito com decisões de curto prazo no mundo todo. A Conferência deve chamar a atenção dos governos para o fato de que planejamento para o longo prazo é absolutamente essencial.”

Não por acaso, Inovação e Colaboração para o Futuro que Queremos é o tema do Fórum sobre Sustentabilidade Corporativa, principal vitrine para exposição de boas práticas das empresas na Rio+20. O evento é coordenado pelo Pacto Global – iniciativa das Nações Unidas que tem a adesão de mais de 6 mil empresas do mundo todo a 10 princípios universais nas áreas dos direitos humanos, direitos trabalhistas, meio ambiente e contra a corrupção.

O Fórum acontecerá de 15 a 18 de junho, na semana que antecede a cúpula de governantes, com uma agenda de 60 sessões sobre temas relacionados à agenda da própria Conferência: Clima e Energia; Urbanização e Cidades; Água e Ecossistemas; Desenvolvimento Social; Financiamento do Desenvolvimento Sustentável; Agricultura e Segurança Alimentar.

As lideranças do setor agrícola brasileiro, por exemplo, querem mostrar ao mundo as soluções já desenvolvidas para adaptação da produção às condições exigidas pelo equilíbrio socioambiental. Três delas aplicam técnicas que buscam melhorar a sustentabilidade do agronegócio.

No plantio direto, por exemplo, não se revolve o solo. O trabalho é realizado no mesmo nível entre o plantio e a colheita. A vegetação permanece na terra para decomposição e forma uma camada de material orgânico. Na safra seguinte, a semeadura é direta, com maior retenção de nutrientes. Em 1990, os produtores brasileiros realizavam o plantio direto em 2,6% da área de sojicultura; hoje, aplica-se a técnica em mais de 50% da lavoura.

Outra prática, a integração lavoura-pecuária-floresta, utiliza os terrenos alternadamente para culturas e pastagens, mas uma fileira de árvores é também plantada entre os campos, onde o gado pode apascentar.

A técnica atende à melhor recomendação para recuperar terras degradadas, ao intensificar o uso do solo e fazer a rotação de pastagens e das áreas plantadas, enquanto alimenta pessoas sem derrubar as florestas.

A cadeia do etanol é outra solução integrada, porque apresenta uma evolução expressiva no plantio, colheita (sem queima) e produção de energia.

“A aplicação dessas técnicas tem resultados quantificados com enorme redução do impacto ambiental”, comemora Luiz Carlos Corrêa Carvalho, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG).

A entidade promoveu, em fevereiro, o fórum Despertar para a Rio+20, no qual mostrou aos associados as formas de participação e influência na Conferência de junho. Uma delas, coordenada pelo Ministério da Agricultura, recolhe opiniões das entidades representativas do setor para reuni-las no documento A Contribuição da Agricultura Brasileira na Construção de uma Economia Verde e na Erradicação da Pobreza.

O título do documento aborda um dos eixos temáticos propostos pela ONU para os debates no Rio: A Economia Verde no Contexto do Desenvolvimento Sustentável e da Erradicação da Pobreza – o outro eixo trata da Governança Global para o Desenvolvimento Sustentável.

Inclusão

“Por mais amplo que seja o conceito de economia verde, o que vale é o que as pessoas escutam; e as pessoas estão entendendo que economia verde trata de como enfrentar a questão ambiental. Mas sem trabalhar a inclusão social não dá: o Brasil tem dito isso, vários países têm dito, e é o que nós temos dito também” – afirma o vice-presidente do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, Paulo Itacarambi. “Aos poucos vai ficando claro que não é no contexto da erradicação da pobreza, mas para erradicar a pobreza, para reduzir a desigualdade. É uma economia para isso e para trabalhar dentro dos limites dos recursos naturais.”

O Ethos é uma das organizações mais ativas nas negociações de propostas da iniciativa privada para o debate na Rio+20. No fim do ano passado, 95 organizações nacionais e multinacionais de variados portes e naturezas, como associações corporativas e sindicatos profissionais, institutos, fundações e empresas de serviços, do comércio e da indústria assinaram um documento que circulou em três níveis.

“Passamos para a comissão nacional, presidida pelo Itamaraty, e também para outros órgãos que faziam consultas setoriais: os ministérios do Meio Ambiente, da Fazenda e o Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social. E também levamos diretamente para a ONU”, conta Itacarambi. “É uma participação relevante, mas apenas uma pequena parte do que foi proposto entrou no documento do governo brasileiro. Também se vê muito pouco no Draft Zero” (documento elaborado pela ONU, em consulta a governos, empresas e sociedade civil, para servir de base ao texto final que será negociado até a Rio+20).

Itacarambi lembra que o acordo a ser debatido na cúpula de governantes, de 20 a 22 de junho, é resultado de um processo que busca firmar consensos. “E, para chegar nisso, o consenso fica num nível muito baixo. Mais importante é saber se o que está sendo acordado vai para a vida real ou não.”

Na avaliação feita pelo Ethos em debate com as empresas que representa, concluiu-se que é preciso internalizar na economia e na política os compromissos já assumidos desde a Eco-92. “Nem precisamos adotar mais nada. Se a Rio+20 se colocar no caminho da crise, e o acordo dos governos for para valer, o resumo será o seguinte: o desenvolvimento sustentável é a saída para a crise. Aí os governos estariam assumindo que o caminho é o investimento produtivo sustentável; do contrário, a crise de 2008, que se repetiu em 2011, vai continuar reincidindo. O que não dá para sustentar é esse modelo concentrador do capital financeiro degradante dos outros capitais – o capital natural, o social e o humano.”

Essa análise identifica, no entanto, progressos significativos como decorrência das conferências globais, desde Estocolmo em 1972. “Foram feitos excelentes experimentos de governos, dos poderes locais, de empresas e da sociedade civil. Isso gerou conhecimento, experiência e ferramentas. Estamos prontos, mais maduros para colocar em prática de forma generalizada”, defende Itacarambi.

Compartilhar

Compartilhar conhecimento, experiência e ferramentas é o que vem fazendo com sucesso uma das maiores companhias transnacionais brasileiras, o Itaú-Unibanco, que atua em 19 países. A superintendente de Sustentabilidade, Denise Hills, concorda que “a tendência está dada; a questão é a velocidade de implantação” dos instrumentos já desenvolvidos.

Premiado com o título de Banco Sustentável do Ano, em 2011, pela International Finance Corporation (braço financeiro do Banco Mundial) e pelo jornal Financial Times, o Itaú também participa das rodadas de negociações com o governo, oferecendo ideias já aplicadas no relacionamento com clientes e fornecedores. Entre os temas mais relevantes que pretende apresentar na Rio+20 está a educação financeira, para promover o uso consciente do dinheiro e do crédito.

“Educação financeira representa, para o banco, um tema de sustentabilidade mais importante do que a água, porque nosso consumo não é relevante” – explica Denise. “Nosso objetivo é contribuir para o amadurecimento do mercado, a expansão do crédito e a inclusão, com o conhecimento que temos, para que o mercado seja mais eficiente no longo prazo. E não se trata de vender produtos e serviços, mas de entender e revalorizar o significado do dinheiro na vida das pessoas, para que na hora de efetivar uma escolha financeira – que pode ser uma previdência ou um crédito – elas saibam fazer a escolha de forma eficiente para elas e para o banco. Para isso desenvolvemos cartilhas, que estão na internet e disponíveis nas agências, assim como trabalhamos com nossos colaboradores, no sentido de orientar os clientes nessas escolhas.”

Outro tema importante mencionado por Denise é o de riscos e oportunidades socioambientais: “A nova dinâmica da sustentabilidade implica compartilhar dúvidas e soluções, incorporando as contribuições da ciência. Na área de seguros, por exemplo, podemos compartilhar conhecimento com o cliente informando que, se chover um índice acima de ‘x’, pode haver um deslizamento ou uma inundação.

Então, de posse dessa informação, o cliente vai poder avaliar o risco e a consequência da opção que vai fazer. Essa prática visa não só diminuir o índice de sinistros da seguradora do banco mas também ajudar a sociedade a estar mais preparada para enfrentar esse tipo de evento climático extremo”.

O setor de seguros é um dos focos do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente na Rio+20. “O braço financeiro do Pnuma prepara o lançamento dos Princípios do Seguro Sustentável (PSI, na sigla em inglês), um conjunto de regras de adesão voluntária, com alcance global, para a gestão dos temas ambientais, sociais e de governança aplicáveis pela indústria de seguros” – informou à Ideia Sustentável o chefe da seção de Economia e Comércio do Pnuma, Steven Stone. “A estrutura do PSI também estabelece uma iniciativa apoiada pelas Nações Unidas para que os signatários possam promover, adotar e implementar esses princípios globalmente.”

A Unilever, gigante multinacional do ramo industrial, entende que outro grande desafio da Rio+20 é a preparação do consumidor para se engajar apropriadamente na economia verde. A diretora de Assuntos Corporativos, Juliana Nunes, cita o exemplo do detergente líquido e do amaciante que “na formulação concentrada têm redução de até 80% no uso da água e claramente demanda uma mudança de hábito de consumo”. O que a empresa faz, diz Juliana, é “mostrar, já no ponto de venda, como usar o produto.”

Essa é a interface com o cliente de um ambicioso programa que prevê, também, o uso de menos embalagem por unidade de produto, reduzindo o peso transportado e consequentemente a emissão de gases de efeito-estufa na cadeia produtiva. “A meta, para 2012, é ter uma emissão igual ou inferior à do ano de 2007.

A partir de 2008, apesar do crescimento do nosso negócio, mantivemos o mesmo volume de emissões nas operações de manufatura e não manufatura no Brasil” – comemora Juliana. A meta integra o Plano Global de Sustentabilidade da Unilever, lançado em 2010, que se aplica em três pilares: saúde e nutrição, redução do impacto ambiental e envolvimento da cadeia produtiva com fornecimento de insumos sustentáveis certificados.

O Fator Indução

Esse é o tipo de relato que embala os sonhos do vice-presidente do Ethos, Paulo Itacarambi: “Imagine que os 100 maiores grupos transnacionais assumissem o compromisso de operar, em qualquer país, no melhor padrão do ponto de vista da sustentabilidade – em relações do trabalho, respeito e promoção dos direitos humanos, gestão dos recursos naturais e ecoeficiência. Se adotassem esse padrão em todos os países, independentemente da legislação local (que pode ser menos exigente), a competição internacional se daria em outras bases.Hoje, o capital se desloca para os países onde a exigência é menor. Então, degrada-se o capital natural, o capital humano, o capital social: quem paga é aquela sociedade que não teve condição de fazer esse nível de exigência, às vezes pressionada pelo próprio capital para não aumentar a exigência. Mas se a transnacional eleva seu próprio padrão de sustentabilidade, então a competição vai se dar nesse nível mais elevado: toda a sociedade, toda a economia, passa a operar num nível de maior exigência com o equilíbrio socioambiental. Claro que são padrões, são réguas que tem de ir subindo aos poucos.”

Itacarambi acredita que algumas empresas de porte podem declarar compromissos desse tipo com a sustentabilidade até mesmo dentro da Rio+20. “A proposta já foi apresentada no documento do Ethos. Nosso maior trabalho é fazer esse bonde andar; algumas empresas dizem que dá. A intenção é estabelecer um conjunto de compromissos e fazer essa indução, que acaba chegando aos governos”, diz.

No mundo real, é central o papel de indução da sustentabilidade “no modelo de desenvolvimento das empresas listadas, dos investidores, dos analistas e dos stakeholders que gravitam em torno da Bolsa”, afirma a diretora de Sustentabilidade da BM&FBovespa, Sonia Favaretto.

“Para a Rio+20, estamos trabalhando desde novembro numa série de encontros para orientação sobre como fazer o Relatório de Sustentabilidade pelo modelo GRI (Global Report Initiative). É mais um degrau na direção da transparência, que representa uma questão básica para o bom funcionamento do mercado: oferecer informação transparente sobre as empresas.”

O objetivo da iniciativa Relate ou Explique é saber de cada empresa listada na Bolsa se ela publica Relatório de Sustentabilidade ou similar – e, se não publica, por que não o faz. “É uma prestação de contas para a sociedade”, diz Sonia.

“Dez associações vinculadas ao mercado de ações foram consultadas sobre a proposta, para mostrar também que essa agenda deve ser construída em conjunto.” As empresas têm até 31 de maio, que é o prazo normal do mercado, para responder ao formulário de referência que solicita esse dado. “Vamos reunir todas essas informações e disponibilizar no site da Bolsa durante a Rio+20. A ideia é usar o palco da Conferência para mostrar que o mercado brasileiro está se organizando para dar maior transparência a todas as relações de mercado e facilitar o acesso do investidor nacional e internacional.”

A BM&FBovespa também está ajudando a organizar o Sustainable Stock Exchange Global Dialogue, promovido pelo PRI – Principles for Responsible Investment, iniciativa das Nações Unidas que definiu um conjunto de princípios para orientar investidores atribuindo maior valor às companhias que incorporam a responsabilidade socioambiental a suas atividades.

Além do PRI, mais três organismos da ONU – o Pnuma, o Pacto Global e a Unctad (Conferência para o Comércio e Desenvolvimento) – organizam conjuntamente o Diálogo Global das Bolsas Sustentáveis, que será realizado no dia 18 de junho, no Rio, antecedendo a Conferência da ONU.

A Sustainable Stock Exchanges tem o objetivo de estimular todos os agentes dos mercados de ações no sentido de fortalecer a transparência das companhias listadas em Bolsas de Valores, observando as performances em matéria socioambiental e de governança corporativa na análise de investimentos de longo prazo.

O ISE – Índice de Sustentabilidade Empresarial da BM&FBovespa representa um importante indicador de que empresas comprometidas com a sustentabilidade apresentam melhores resultados para os investidores. Acumula, desde 2005, ganhos de 111%, enquanto o Ibovespa, que reúne as demais empresas, cresceu 93%.

Conduta Sustentável

A Rio+20 pode representar uma grande oportunidade de alinhamento da economia global a um código de conduta que favoreça empreendimentos sustentáveis. “Mesmo que o crescimento econômico global nos anos recentes não seja dos mais expressivos, a entrada no mercado de centenas de milhões de consumidores está mudando a economia mundial” – analisa o embaixador Correa do Lago. “Precisamos estabelecer padrões de produção e consumo que sejam condizentes com o número de pessoas que, ainda bem, passaram a consumir.”

Nesse contexto, os negociadores dos países já fecharam um acordo para propor, na Rio+20, os chamados Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), uma iniciativa do governo brasileiro nos moldes dos Objetivos do Milênio (ODM) – conjunto de metas econômicas e sociais estabelecidas pela ONU que devem ser atingidas por todos os países até 2015 (no Brasil também conhecidas por 8 Jeitos de Mudar o Mundo).

Embora aparentemente os ODS pareçam esbarrar nos compromissos do Pacto Global – que poderiam ser estendidos aos governos e organizações da sociedade civil -, o comitê da rede brasileira da plataforma empresarial afirma que apoia a iniciativa.

“Os ODS não devem ser confundidos com os princípios do Pacto Global nem com os Objetivos do Milênio. Pretendem ser menos conceituais que os primeiros e mais amplos que os segundos”, assina em nota o comitê.

Um dos ODS, por exemplo, seria a redução das emissões de CO2 em 50%, até 2050. Os demais devem incluir temas como energia, água, erradicação da pobreza e segurança alimentar. A diferença, segundo Correa do Lago, é que “os ODM são uma agenda para países muito pobres; e os ODS devem ser aplicáveis também aos desenvolvidos, com capacidade tecnológica e que criaram os padrões vigentes. O impacto direto sobre os negócios vai ser gigantesco, porque é uma mudança muito importante na forma de comportamento e de produção”, prevê.

Apesar do acordo para o lançamento dos ODS, a potência do impacto nos negócios é o que retarda a definição dos termos desse alinhamento, neste momento que antecede a Conferência. Correa do Lago relata que “os países desenvolvidos gostariam que os ODS fossem aplicados apenas aos países não desenvolvidos; e nós obviamente queremos que seja algo equilibrado: países em desenvolvimento têm de fazer alguma coisa, mas os desenvolvidos não podem escapar daquilo que estão evitando há muito tempo, já que estes acumulam um passivo muito pesado principalmente na área de energia e para a sustentabilidade de muitos setores econômicos”.

Embora de escopo mais abrangente, esse embate é claramente uma extensão daquele que antagoniza os dois blocos na questão das mudanças climáticas. Com o título de “Objetivos” do Desenvolvimento Sustentável, em tese esse acordo teria de apresentar metas a serem perseguidas por toda a sociedade global.

Mas não é o que se vislumbra no Draft Zero. Divulgado em janeiro, o documento reúne sugestões e contribuições de países, grupos regionais, organizações internacionais e da sociedade civil. “O texto fala sobre economia verde, criação de empregos verdes e comprometimento dos governos com o que foi decidido na Rio-92, com a Agenda 21, e em outros documentos da ONU, mas não tem metas: o que fazer, como fazer e até quando” – avalia o presidente do Comitê Brasileiro do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Instituto Brasil Pnuma), Haroldo Mattos Lemos.

Governança Ambiental

A criação de empregos verdes é um indicador crucial para permitir à sociedade o acompanhamento da instauração do desenvolvimento sustentável. Mas a falta de profissionais capacitados para a economia verde foi identificada como a segunda mais importante entre as 21 Questões Ambientais do Século XXI, estudo patrocinado pelo Pnuma que consultou 428 cientistas do mundo todo.

A ideia é alertar os líderes reunidos na Rio+20 sobre problemas estruturais que não estão recebendo a devida atenção dos governos.

No topo da lista elaborada pelos cientistas está a falta de mecanismos de governança global para o meio ambiente. Esse é outro eixo dos debates na Rio+20, tão cercado de desafios quanto a transição para a economia verde.

A ausência de um sistema de governança ambiental com poder decisório e punitivo é o que explica, por exemplo, a existência de cerca de 900 acordos internacionais com foco ambiental de eficácia duvidosa – a exemplo da Convenção do Clima (resultado da Eco-92, a Convenção entrou em vigor em 1994, com o objetivo de estabilizar as concentrações de gases do efeito estufa a níveis que prevenissem uma interferência humana no sistema climático).

Existe a expectativa de que o Pnuma possa ganhar status de uma agência autônoma, como a Organização Mundial do Comércio, que detém instrumentos efetivos para obrigar os países a cumprirem suas regras e decisões. Atualmente, na condição de programa, o Pnuma depende de contribuições voluntárias e tem apenas 58 países-membros. Mas essa transformação teria de ser aprovada pela Assembleia das Nações Unidas em tratado específico.

Outra proposta, mais ambiciosa, poderá ser pelo menos debatida na Rio+20: a criação de um Conselho do Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, que se reportaria diretamente à Assembleia Geral e teria força semelhante à do Conselho de Segurança.

É o que defende o documento encaminhado pelo Instituto Ethos ao governo brasileiro e à ONU para implantar um novo modelo de desenvolvimento, que respeite os limites dos recursos naturais e tenha como meta a redução das desigualdades sociais e a erradicação da pobreza.

“O que nos ameaça é tão contundente quanto uma guerra, porque provoca muito mais mortes e vai provocar ainda muito mais” – argumenta Paulo Itacarambi. “E o esforço que demanda essa mudança também é um esforço de guerra.”

Estamos numa espécie de emergência planetária” – afirma Mattos Lemos, do Pnuma no Brasil. “As questões ambientais vão se agravar e, quanto mais demorarmos a tomar ações concretas, mais difícil e mais caro vai ser para a humanidade enfrentar esses problemas.”

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