Especial – Tendência 5: Precificação dos Serviços Ambientais

Especial – Tendência 5: Precificação dos Serviços Ambientais

Fazendo a conta da natureza
 
Os preços levarão em conta quanto custa para a natureza os serviços ambientais e as matérias-primas. Haverá uma crescente substituição da lógica atual, ainda centrada no risco, por outra baseada em oportunidades de negócios a partir do conhecimento da dependência da empresa em relação aos ecossistemas. Em vez de minimizar impactos negativos o novo paradigma será como causar impacto positivo para a natureza
Imagine se uma empresa tivesse hoje de remunerar abelhas, insetos, aves e outros seres vivos – ou ainda as árvores de uma floresta mantida em pé – por serviços como os de polinização, fertilização do solo, umidade do ar, clima estável. Nesse cenário – onde seria necessário pagar pelo que, hoje, a natureza ainda provém de graça – cada vez mais os preços de produtos e serviços levarão em conta quanto custa para o planeta fornecer as matérias-primas.
A conta certamente não é tão simples quanto parece. Mas possível de ser feita. Assim como o Relatório Stern – estudo encomendado pelo governo britânico e lançado em 2006 – sobre os custos econômicos das mudanças climáticas introduziu uma nova forma de pensar o aquecimento global, constatando, por exemplo, que as perdas devido a condições climáticas extremas equivalem a algo como US$ 200 bilhões, hoje outras iniciativas têm a chance de fazer o mesmo com o valor do patrimônio do capital natural.
Esse é o caso de The Economics of Ecosystems and Biodiversity – TEEB, publicado este ano (2010) pelo Programa das Nações Unidas Para o Meio Ambiente (PNUMA). O estudo revelou que as perdas econômicas globais causadas pela degradação dos ecossistemas e da biodiversidade provenientes apenas do desmatamento estão entre US$ 1,9 e U$ 4,5 trilhões ao ano. Isso mesmo, a casa numérica é dos trilhões.

O TEEB reforça, ainda, que é preciso explicitar o valor desses serviços, para assim construir instrumentos capazes de alterar a equação na qual se baseia a decisão de proprietários de terra, investidores e outros usuários dos serviços ambientais. São várias as ferramentas possíveis. Incluem desde os pagamentos por serviços ambientais e reformas de subsídios até impostos para atividades poluidoras, taxas de recursos e a cobrança por entrada nos parques nacionais, para ficar em alguns exemplos.
Como fazer, no entanto, para que as empresas compreendam e incorporem essa nova métrica? Hoje existem várias ferramentas que ajudam a botar valor nos custos ambientais, como a Trucost, a InVEST, a INCR e a ENV (ver quadro). Mas é possível também identificar algumas pistas no estudo The Biosphere Economy, da think tank inglesa Volans, mais precisamente na citação de Mikkel Kallespe, do World Business Council for Sustainable Development (WBCSD).
Para ele, o conceito de serviços ecossistêmicos ou serviços ambientais é mais tangível para o negócio do que a biodiversidade, palavra hoje muito comum na agenda de empresas que dependem muito dos insumos da natureza. Revoluções conceituais importantes vêm por aí, acredita. “Estamos falando de água limpa, colheitas, polinização, fibras e controle de erosão. Essas unidades combinam com outros inputs em um modelo de negócio ou um processo produtivo. Veremos uma profunda mudança na forma de lidar com questões ambientais, de uma visão centrada na gestão de risco para o desenvolvimento de novas oportunidades de negócios a partir do conhecimento da dependência da companhia em relação aos ecossistemas”, ressalta.
Novo jeito de pensar exige líderes diferentes
Conceitos novos requerem líderes novos, orientados por um novo modelo mental baseado na interdependência entre os sistemas econômico, ambiental e social. O papel das lideranças será, portanto, fundamental. Estudo recente da consultoria Accenture aponta, em uma de suas conclusões, que no esforço de liderar a criação de um ambiente de investimento mais favorável aos negócios sustentáveis, o CEOs precisam ser mais pró-ativos e engajar investidores, conseguindo demonstrar o valor das atividades sustentáveis por meio de indicadores tradicionais, como redução de custos e crescimento da receita. O mesmo certamente vale para o patrimônio da biodiversidade.
Segundo o estudo, os executivos estão conscientes do papel importante que tecnologias inovadoras exercem no avanço da agenda de sustentabilidade em áreas como mudanças climáticas (por exemplo, usando tecnologias inteligentes, como redes e medidores). Consultados, 91% dos CEOs informaram que suas empresas vão empregar novas tecnologias (energias renováveis, eficiência energética, tecnologias em informação e comunicações) para auxiliar no alcance de suas metas de sustentabilidade nos próximos cinco anos.
Historicamente, a maioria das empresas inventa suas próprias “rodas”, criando ou inovando por si mesmas. Mas, em 2009, um novo espírito de colaboração tomou posse das corporações. Lançado um ano antes (2008) pela IBM, Nokia, Pitney Bowes, Sony e Conselho Empresarial Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, entre outras organizações, o Eco-Patent Commons decolou no ano passado. A iniciativa visa a contribuir com patentes ambientais para o domínio público. Entre outras ações, o grupo criou o 100th IP free-tecnology, ou seja, disponibilizou as inovações (também conhecidas como “propriedade intelectual” ou IP) para todos os participantes, segundo informação do State of Green Business, estudo do site americano Green Biz, especializado em analisar os impactos da emergente economia verde sobre o meio ambiente.
Ainda segundo o site, paralelamente outro grupo de compartilhamento de tecnologia chamado GreenXchange foi lançado, com o objetivo de permitir que as empresas partilhem sua propriedade intelectual de design de produtos verdes, embalagem e fabricação. Fundado pela Nike, Best Buy e outras empresas, o grupo está consolidando parceria com a Creative Commons, uma organização sem fins lucrativos que projeta licenças para permitir aos criadores de propriedade intelectual compartilhar seu trabalho. Esses certificados têm sido utilizados por diversos organismos, desde a Wikipedia até a Casa Branca.
O Environmental Defense Fund também iniciou uma troca de inovação (Innovation Exchange) para encorajar as empresas a compartilhar as melhores práticas relacionadas a energia, água, clima e uma série de outras questões.
Tudo isso ajuda as corporações a fazer a tal conta da natureza. No primeiro semestre de 2010, CEOs de 29 empresas globais, integrantes do WBCSD, lançaram a Visão 2050. Ela desenha um futuro no qual o preço de mercado reflete precisamente os custos ecológicos de se fazer negócios. “Ao longo do tempo ficaremos muito mais atentos à nossa dependência em relação, por exemplo, aos ciclos hidrológicos e de carbono, e mesmo aos menos óbvios, como os serviços de polinização oferecidos pelas abelhas e outros insetos”, aponta o documento.
O que dizem as empresas
No modelo econômico vigente, a lógica em relação aos recursos naturais está longe de ser equilibrada. Empresas extraem matérias-primas e utilizam outros serviços ambientais muitas vezes sem o mínimo critério, devastando o meio ambiente e causando danos irreversíveis aos ecossistemas. No entanto, esse quadro começa a mudar diante da escassez de alguns recursos e da preocupação gerada por eventos climáticos extremos decorrentes de um sistema em desequilíbrio dinâmico.
“O efeito causado pela humanidade sobre os serviços ambientais é inexorável. Faz parte do papel das empresas estabelecer limites para suas ações no que se refere ao uso coordenado desses recursos, e também papel dos Estados promover um esforço multilateral que inclua setor privado, governo e academia para tentarmos quantificar e detalhar o valor desses serviços, buscando sua incorporação num aspecto visível da economia”, avalia Marcus Vaz, diretor de Sustentabilidade da Natura.
Após tantas décadas consumindo recursos sem a devida prudência, aproxima-se a hora de as empresas “pagarem o preço” dos ecosserviços, desenvolvendo ações para reduzir danos socioambientais e investindo em inovação para novos modelos sustentáveis de negócios.
“Sem dúvida, é inevitável que os custos de serviços ambientais sejam acrescidos ao preço de determinados produtos. Quanto mais o consumo de determinada matéria-prima agredir a natureza, maior será o seu custo, tanto pela escassez como pela necessidade de remediar os danos ao meio ambiente em casos mais graves”, destaca Walter Duran, diretor de Sustentabilidade da Philips.
Uma nova atitude em relação ao uso de recursos naturais, portanto, deverá se manifestar tanto pela consciência socioambiental de gestores quanto pela necessidade de manter um negócio financeiramente saudável. “A manutenção da biodiversidade e dos serviços ao meio ambiente é uma forma de gerar ganhos para a comunidade. Brevemente, deixará de ser uma tendência para se tornar prática cotidiana de cada empresa”, ressalta Juliana Rehfeld, gerente corporativa de Desenvolvimento Sustentável da Anglo American.
Ferramentas para valorar serviços ambientais:
Trucost – integra um movimento que pretende mudar a forma como as empresas são ‘valoradas’.
InVEST – desenvolvido pela Gretchen Daily, esse software quantifica os ativos ecológicos de determinada região – e estima como os seus valores vão mudar em diferentes cenários.
Investor Network on Climate Risk (INCR) – braço da Ceres (maior coalizão de investidores América do Norte), reúne U$8 trilhões em ativos e mais o P8, grupo de líderes dos fundos de pensão que representa mais de U$ 3 trilhões de capital de investimento.
Natural Value Initiative (NVI) – parceria entre o NGO Fauna & Flora International, o United Nations Environment Programme’s Finance Initiative (UNEFI) e a Fundação Getúlio Vargas. Em 2009, o NVI testou a primeira versão do seu Ecosystem Services Benchimark with Companies, publicando um ranking de 31 companhias do setor extrativista, de alimentos, bebidas e tabaco.
Corporate Ecosystem Services Review (ESR) – uma ferramenta que permite conectar a atividade do negócio com a saúde dos ecossistemas. Já está sendo implementada em mais de 300 companhias ao redor do mundo.
Global Reporting Iniciative (GRI) – começou um trabalho, agora em 2010, acerca das implicações dos serviços ecossistêmicos para a mensuração da performance no reporting das companhias.
Ecosystem Valuation Initiative – modelo que permite a valorização dos serviços ecossistêmicos em áreas-chave do negócio e está sendo testado em 16 empresas associadas do WBCSD. Os resultados serão divulgados a partir de 2011.
Fonte: The Biosphere Economy, Volans
Caminho das pedras
5 passos para identificar riscos e oportunidades nos serviços do ecossistema
1. Selecione o escopo
Escolha um foco para conduzir a revisão dos Serviços Ecossistêmicos Corporativos (ECR). Pode ser uma unidade de negócios específica, produto, mercado, latifúndio, grandes clientes ou fornecedores.
2. Defina os serviços ambientais prioritários
Avalie sistematicamente o grau de dependência da empresa e impacto sobre mais de 20 serviços de ecossistema. Determine os serviços de maior “prioridade” – os mais relevantes para o desempenho do negócio.
3. Analise as tendências em serviços prioritários
Pesquise e avalie condições e tendências nos serviços ecossistêmicos prioritários, bem como os condutores dessas tendências.
4. Analise os riscos e oportunidades de negócio
Identifique e avalie os riscos e oportunidades de negócio que possam surgir devido às tendências nos serviços ambientais prioritários
5. Desenvolva estratégias
Esboce e priorize estratégias para gerir os riscos e oportunidades
Fonte: Corporate Ecosystem Services Review (ESR): Guidelines for Identifying Business Risks and Opportunities Arising from Ecosystem Change. Version 1.0 (2008)/ World Resources Institute/World Business Council for Sustainable Development/ Meridian Institute
10 razões para empresas avaliarem ecossistemas
1. Melhorar a tomada de decisão do negócio
2. Capturar e precificar novos fluxos de renda
3. Reduzir custos
4. Reduzir impostos
5. Sustentar receitas
6. Reavaliar ativos
7. Investigar novos produtos e serviços
8. Avaliar a responsabilidade e compensação
9. Mensurar o valor da empresa e das ações
10. Reportar o desempenho
Fonte: Corporate Ecosystem Valuation: Building the Business Case
(Avaliação Corporativa de Ecossistema: Construindo o Caso dos Negócios)/ World Business Council for Sustainable Development (2009)

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