Líderes, esforçadas, cínicas e indiferentes

Líderes, esforçadas, cínicas e indiferentes

Desde quando apresentou, em agosto de 2008, uma classificação em quatro categorias de empresas em relação à sustentabilidade, esta coluna tem recebido uma quantidade importante de e-mails de leitores de todo o Brasil solicitando exemplos de companhias líderes, esforçadas, cínicas e indiferentes. Descontados os que demonstram interesse explícito na polêmica pela polêmica, atrás de rankings fáceis ou de notas baixas para empresas pelas quais nutrem antipatia, a grande maioria parece mesmo preocupada em conhecer melhor as corporações e, assim, usar o seu poder de compra, premiando as mais sustentáveis e punindo as menos comprometidas com o assunto. Deseja ter uma espécie de mapa de orientação para se defender das mentiras do greenwashing.
Classificações –vale dizer– servem tão somente para orientar o raciocínio e facilitar a compreensão. Não devem ser tomadas ao pé-da-letra. No caso específico da que foi proposta em 2008, ela se prestava –e se presta ainda — a ampliar o repertório de critérios objetivos proporcionando ao leitor elementos para ele próprio julgar o quanto a empresa é ou não sustentável. A respeito desses critérios, vale relembrar as características apontadas para empresas de cada uma das quatro categorias.
As líderes, como o nome sugere, estão à frente das demais. Não só porque avançaram mais, e de modo acelerado, mas porque acolheram, com maior convicção, o desafio das mudanças de processos, modelos e estratégias de negócio imposto ao longo da jornada da sustentabilidade. E eles são muitos e complexos. Pioneiras, iniciaram-se há pelo menos 10 anos, quando o tema equivalia quase a um gesto altruísta mais do que representava uma nova lógica de gestão. Abriram a trilha, em meio a um deserto, tentando convencer os acionistas de que não deixariam de ser lucrativas por assumirem responsabilidades socioambientais.
As empresas líderes fizeram uma trajetória semelhante. Primeiro, realizaram investimento social privado, ajudando a promover o desenvolvimento de comunidades. Depois, inseriram práticas de responsabilidade social em sua cadeia produtiva, passando a considerar, na gestão do negócio, os impactos de suas atividades sobre os diferentes públicos de interesse. E, mais recentemente, adotaram o triple bottom line como mote para pensar e fazer negócios, encarando a sustentabilidade não mais a partir da lógica prevalente do risco, mas da racionalidade ascendente da oportunidade e da inovação. Nelas, há sempre a presença de um líder missionário do tema, com crenças firmes e compromissos, claros.
As esforçadas acompanham as pegadas das líderes. No entanto, o fazem em ritmo mais lento, não tão linear, com idas e vindas, ou porque demoraram um pouco mais a pegar a estrada sustentável ou simplesmente porque estão em negócios complexos (em que mudanças de modelo são onerosas e representam desafios difíceis de superar no curto prazo) ainda enfrentam os dilemas decorrentes da implantação de práticas de responsabilidade social. Como nas líderes, percebe-se nelas atenção específica a ações de ética e transparência, engajamento de fornecedores, preservação de meio ambiente, respeito a direitos humanos e diálogo com comunidades. A despeito de consistentes, essas práticas, dissociadas da estratégia, ainda não foram suficientes para mudar modelos de negócios. Carecem de liderança mais compromissada, crenças mais fortes, prioridade ao tema e cultura organizacional receptiva às mudanças.
As cínicas são as que se dizem sustentáveis apenas por conveniência. Não fazem nenhum esforço para serem sustentáveis. Sequer sabem o significado do conceito em toda a extensão. Para fora, adotam uma pregação altruísta. Para dentro, seguem grudadas ao velho modelo mental do bottom line trimestral e do retorno ao acionista como o principal compromisso. No fundo, acham a sustentabilidade uma idéia boba, uma filosofice incompatível com negócios, um custo extra que vai reduzir competitividade. Crêem, obtusamente, no dilema já decadente de que não é possível ser rentável e sustentável ao mesmo tempo. Para elas, responsabilidade social é ter um projeto comunitário bacana, pequeno e barato.
Ninguém precisa se dar ao trabalho de distinguir as indiferentes. Até porque elas não desejam ser reconhecidas como sustentáveis. Não possuem crenças nem práticas socioambientais. Seus líderes estão demasiamente ocupados com seus próprios problemas para pensar em comunidades, meio ambiente, ética, governança e desenvolvimento social.  Assim como as cínicas, as indiferentes também não enxergam muito sentido no conceito. A diferença é que não fazem nenhuma questão de parecerem interessadas nele. São, simplesmente, desligadas.
Uma boa maneira de reconhecer as categorias é analisar a história do tema em cada empresa, sua evolução, o modo como os líderes o defendem e como se insere no seu jeito de pensar e fazer negócios.

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