Ponto de vista – As marcas fortes trazem credibilidade e visibilidade também a área social

Ponto de vista – As marcas fortes trazem credibilidade e visibilidade também a área social

Qual a importância de uma marca forte no campo das ações sociais?
 
A invasão do modelo “marketeiro” nas organizações sociais vem transformando o terceiro setor numa verdadeira arena de negócios. Entendo o lado produtivo desse processo para o campo das ações sociais, mas não ignoro as suas diferentes facetas.
Às vezes sou procurado por organizações que desejam construir de maneira mais profissional o patrimônio da sua imagem. Observo que, independentemente do porte, normalmente acreditam realizar um trabalho consistente o suficiente para ter mais notoriedade, ou pelo menos a mesma, das suas “concorrentes”. Estive, aliás, falando desse assunto numa mesa de debate e me perguntaram: “o senhor não acha um absurdo falarmos em concorrência, na área social?”. Eu respondi: “não, eu acho um absurdo a sociedade ainda entender concorrência como uma espécie de confronto em que, se um ganha, outro perde.” Precisamos, antes de tudo, desmistificar esse conceito.
Para quem leu livros como A quarta ondaUm novo jeito de fazer negócios, fica claro que o futuro aponta para a necessidade de um novo modelo de relações entre organizações, na medida em que emerge a necessidade da cooperação e o significado do mútuo benefício, inclusive entre “concorrentes”.
Na área social, as organizações lutam por recursos escassos, assim como no mercado, e isso caracteriza de fato uma concorrência, embora, nesse caso, o interesse público esteja acima dos interesses particulares dos acionistas. Na medida em que se admite a “concorrência social”, ainda que numa dimensão diferente daquela praticada do mercado, naturalmente incorre-se no conceito de escolha. E é nesse contexto que a lógica do marketing vem transformando causas e organizações do terceiro setor em verdadeiros produtos e marcas (não tenham preconceito contra esses termos).
Um estudo de Harvard realizado com as marcas mais fortes do mundo, como Coca Cola e Malboro, revelou que os pilares de sustentação das marcas mais poderosas são dois: diferenciação e relevância (ser importante na vida das pessoas). No contexto da extrema injustiça social que nos aflige a cada dia, o que pode ser mais relevante que uma organização que tenha como missão ajudar a diminuir esses problemas.
De fato, as organizações do terceiro setor têm um grande potencial e uma estrada aberta para construir o patrimônio das suas marcas. No entanto, ainda são poucas as que se enxergam sob essa ótica. Essa dificuldade não impede, no entanto, que algumas organizações tenham se tornado fortes e notórias o suficiente para ser classificadas como “grifes sociais”, conceito cujo surgimento representa um fenômeno nunca expresso com tanta voracidade, no campo social, como nos dias atuais. Elas atingiram um patamar de notoriedade comparável a grandes empresas multinacionais. Cito como exemplo a marca WWF – Fundo Mundial para a Natureza, que recentemente foi revelada entre as três mais conhecidas na Europa, incluindo as marcas das grandes multinacionais, por uma pesquisa publicada num jornal europeu. O mesmo fenômeno assistimos no Brasil, embora aqui ele seja mais recente e, ainda possamos contar as nossas grifes sociais nos dedos.
As marcas fortes trazem ao campo das ações sociais duas coisas que considero fundamentais: a primeira é a credibilidade. Tenho notado que muitos investimentos sociais deixam de ser realizados, não por falta de recursos, mas pela incerteza de como eles serão utilizados. Iniciativas que incorram em aportes de maior vulto da iniciativa privada para projetos de investimento social (planejados, mensurados e monitorados) exigem uma profissionalização no planejamento e no uso dos recursos que, na maioria das vezes, torna bem-vinda a participação de uma marca forte (grife social), como detentora da confiança dos investidores para execução séria e eficaz do que se propõe.
A segunda é a visibilidade que elas proporcionam às causas por elas defendidas, pois tais organizações acabam tendo um acesso à mídia às vezes maior que as próprias empresas.
O que de fato considero uma ameaça é o risco de concentração exagerada dos investimentos sociais para um número reduzido de organizações. Eu classificaria esse fenômeno como concentração de renda na área social, imaginem? O motivo mais aparente para essa situação é o desconhecimento, por parte das empresas, do imenso, rico e detalhado universo das organizações sociais. Tenho a impressão que muitas escolhas de parceria nessa área se fazem de maneira pouco estudada e planejada.
Entendo e respeito a idéia de apoiar uma grife social como forma de pegar carona na sua notoriedade e confiança. Defendo, no entanto, uma análise mais criteriosa acerca da causa a ser apoiada e do porquê dessa causa, antes até da escolha de uma organização parceira. Numa conversa recente com o dono de uma marca de cosméticos, em ascensão, ele revelou estar planejando uma estratégia de arrecadação de recursos para uma grife social voltada para pessoas com deficiência. Não me cabe julgar essa decisão, mas estimulo todos que pretendem tornar-se investidores sociais a fazer reflexões sobre a relação da causa a ser apoiada com o seu negócio. A escolher uma organização parceira considerando outros critérios, que não apenas a força da sua marca.
Faço votos, também, para que as grifes sociais continuem grifes, pois foram construídas com muito suor, competência e transparência, atributos necessários para se consolidar uma marca forte, no campo social. E que haja cada vez mais grifes sociais, no Brasil.
Já dizia Aristóteles: “Distribuir dinheiro é algo fácil e quase todos os homens têm este poder. Porém, decidir a quem dar, quanto, para que objetivo e como, não está dentro do poder de muitos e nem tampouco é tarefa fácil.”
*João Francisco de Carvalho Pinto Santos é Diretor da The Key – Organizações e Marcas Cidadãs, empresa do Grupo Full Jazz de Comunicação

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