Reflexões sobre a liderança em sustentabilidade

Reflexões sobre a liderança em sustentabilidade

Este Dossiê Verde foi elaborado com base em insights do livro Conversas com Líderes Sustentáveis, de Ricardo Voltolini (Editora Senac-SP, junho de 2011).  Propõe-se a discutir quem são os líderes de sustentabilidade, como agem, pensam e tomam decisões, e em que valores acreditam, utilizando como suporte de análise o relato dos individual cases de Fábio Barbosa (Santander), Guilherme Leal (Natura), Paulo Nigro (Tetra Pak), José Luciano Penido (Fibria), Franklin Feder (Alcoa), Luiz Ernesto Gemignani (Promon), José Luiz Alquéres (ex-Ligth), Héctor Núñez (ex-Walmart), Miguel Krigsner (O Boticário) e Kees Kruythoff (Unilever).

A primeira parte, denominada Cinco traços comuns, complementa ensaio publicado na edição passada de Ideia Sustentável (De que matéria são feitos os líderes em sustentabilidade?), aprofundando-o com mais dados e, principalmente, depoimentos dos presidentes entrevistados. As opiniões registradas servem, sobretudo, para ilustrar as ideias do texto e justificar as conclusões do autor a respeito das características comuns mais destacadas entre os executivos perfilados na obra.

Na segunda parte, apoiando-se também em passagem do livro, o presente Dossiê ressalta os 20 atributos de um líder em sustentabilidade, tomando como mote o Plano para Liderança em Sustentabilidade, lançado pelo Pacto Global das Nações Unidas, em agosto de 2010. Trata-se de um importante material para reflexões de executivos e gestores de empresas.

Na terceira e última parte, Ideia Sustentável aponta uma biblioteca básica para líderes em sustentabilidade. A recomendação bibliográfica, com clássicos e outros mais contemporâneos, reúne livros mencionados pelos presidentes entrevistados ou que serviram para a construção teórica de Conversas com Líderes Sustentáveis.

A íntegra deste material estará disponível no espaço destinado à Plataforma Liderança Sustentável, no portal Ideia Sustentável, projeto cujo objetivo é identificar, mobilizar, inspirar e conectar líderes em sustentabilidade em todo o Brasil.

Os cinco traços comuns das entrevistas feitas com os 10 presidentes

1- Crença firme nos valores que estruturam o conceito de sustentabilidade

Na visão da maioria dos presidentes retratados no livro, ter uma crença firme representa o atributo mais destacado de um líder em sustentabilidade. Não se trata apenas de acreditar, tendo como base o pragmatismo utilitário característico do mundo empresarial, no valor que a sustentabilidade acresce a um negócio, até porque, hoje, como nem clientes nem mercados o rejeitam, ele se tornou commodity. Consiste, sim, em crer profundamente nos valores que dão suporte à noção da sustentabilidade – como o respeito ao outro, aos ecossistemas e à diversidade, à ética altruísta, à justiça, o apreço ao diálogo e à transparência — e, mais do que isso, exercitá-los do dia a dia, valorizá-los em suas atitudes, utilizá-los como fator de orientação para as decisões, das mais simples às mais estratégicas.

A coerência entre o discurso e a ação constitui, na opinião dos líderes perfilados, condição básica para promover credibilidade, aglutinar indivíduos e obter o compromisso—ao mesmo tempo individual e coletivo – sem o qual não se consegue operar transformações em sistemas, modelos e estratégias. As histórias do livro trazem bons exemplos. Fábio Barbosa é um deles. Atual presidente do Conselho do Banco Santander, ele costuma lançar mão de uma metáfora – que já se tornou pérola de sua cartilha –para ressaltar o preceito da coerência. Refere-se às teclas on e off. Segundo o executivo, um líder precisa agir no trabalho como ele age em família e com os amigos. Não há como “ligar” ou “desligar” atitudes e valores éticos segundo as circunstâncias e situações específicas do trabalho e da vida. Do contrário, seus liderados terão todo o direito de duvidar da firmeza de propósito de sua pregação pela sustentabilidade.  Os demais líderes abordam o mesmo tema, com palavras e exemplos distintos.

Valores são construídos ao longo de toda uma vida a partir de estímulos recebidos da educação em casa, na escola, na universidade e nos grupos sociais de referência. São tão decisivos, no caso dos líderes em sustentabilidade, que, mais do que influenciar, definem essencialmente suas escolhas de negócio. “Crença firme mobiliza as pessoas ao seu redor. Mas não basta dizer que se acredita em algo. É fundamental viver a crença no cotidiano, porque só a partir do comportamento coerente os colaboradores conseguem perceber exatamente o que você é e em que você acredita. A coerência no comportamento confere credibilidade à crença”, relatou Barbosa no capítulo A coerência emblemática.

Paulo NigroOutras duas histórias contadas no livro reforçam essa tese. Uma é a de Paulo Nigro, atual presidente da Tetra Pak.  Acostumado desde criança, por influência do pai, a valorizar o não desperdício – e a transformação de resíduos em riqueza -, esse princípio tornou-se sua bandeira pessoal à frente da companhia. Foi fundamental em um de seus desafios profissionais mais relevantes – o salvamento da operação da Tetra Pak no Canadá, afetada justamente por deslizes de natureza ambiental. E, com a crescente preocupação global relacionada à gestão de lixo, contribuiu decisivamente para moldar um estilo muito próprio de liderança, marcado pela causa da reciclagem de embalagens longa-vida, pelo apoio às cooperativas de catadores e pela inserção no encaminhamento de questões de natureza pública, como a recente aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos. “(..) Para ser um guia inspirador em sustentabilidade, deve-se deixar orientar por um conjunto de valores individuais importantes, e não negociáveis, entre os quais o profundo respeito ao ser humano. Só quem respeita o humano pode respeitar o planeta. Carrega consigo o desejo de que o empreendimento, a atividade econômica, melhore o bem-estar coletivo, e não o piore”, disse Nigro no capítulo intitulado O bom reciclador ao planeta retorna.

Se, como sugere Gary Hamel, da London Business School, o sucesso é sempre produto dos valores e da paixão por eles, no caso da sustentabilidade essa máxima se aplica com todo o rigor.  Em uma das passagens do capítulo Liderança com Eros à flor da pele, Guilherme Leal, da Natura, afirmou: “Sem querer pintar o mundo de cor de rosa, acho que o êxito da Natura se deve, sim, à sua cultura e aos seus valores bem expressos no conceito ‘Bem Estar Bem’. Não me refiro apenas ao credo social, político e ambiental. Mas a uma visão de mundo perfeitamente integrada ao negócio, que inclui a interação dos seus produtos com o indivíduo, mediada por uma relação de comunicação profunda e verdadeira.

2- Compreensão da noção de interdependência entre os sistemas econômico, ambiental e social

Compreender a noção de interdependência está na base de um modo diferente de pensar e fazer negócios, muito peculiar nas empresas lideradas pelos presidentes ouvidos.  Um modo, vale dizer, menos autorreferente e, portanto, menos egocêntrico; sobretudo, mais aberto e  respeitoso, segundo o qual o universo não gira em torno das empresas, os resultados financeiros não justificam tudo e os negócios não estão acima da natureza e da sociedade. Dependem, isso sim, do equilíbrio gerado pela combinação justa de lucro, proteção ambiental e justiça social para obterem legitimidade.  E para prosperarem conforme uma nova noção de prosperidade.

De acordo com esse modelo, o melhor negócio é sempre o que entrega resultados para todas as partes e não apenas para a empresa. Os líderes entrevistados agem sob a orientação dessa consciência. Guiados pelo pensamento sistêmico – Peter Senge, não por acaso, apareceu muito nas entrevistas –, enxergam como um todo integrado o que para muitos ainda são apenas pedaços soltos: as esferas econômica, ambiental e social. Mais do que isso, entendem e respeitam a natural complexidade do tema, sua transversalidade e suas ligações profundas não apenas com o negócio em si, mas com toda a cadeia de valor. Acreditam que suas companhias geram valor para a sociedade produzindo e distribuindo bens e serviços mas também bem-estar social. Estão preocupados em assegurar o direito das próximas gerações ao ar limpo, solo fértil, água potável, clima estável e oportunidades iguais de educação e desenvolvimento. E isso não é retórica para fazer boa figura.

Para nós sempre esteve claro que o espaço de uma empresa transcende os seus limites físicos. Na condição de ser social, ela integra a vida da sociedade, influi e é influenciada pelos públicos e comunidades com os quais interage. Logo, tem responsabilidades que excedem as fronteiras econômicas. Isso é ideológico. Nossa responsabilidade social se estende também para as relações estabelecidas com os colaboradores, os clientes e as comunidades com as quais dialogamos”, afirmou Luiz Ernesto Gemignani, presidente do Conselho da Promon, no capítulo denominado O formador de líderes jardineiros.

3- Coragem para enfrentar dilemas e persistência para conduzir as mudanças necessárias

Em artigo escrito para a MIT Sloan Management Review (agosto de 2010), Christoph Lueneburger (Egon Zehnder International GmbH) e Daniel Goleman (autor de Inteligência Ecológica, 2009) afirmam existir três fases para a implantação da sustentabilidade em uma empresa, interpretação com a qual concordamos. Cada uma delas demanda diferentes habilidades e atitudes de quem lidera.

A primeira diz respeito a desenhar e instalar o processo, tirando-o da posição zero. A segunda, a transformar boas intenções em práticas efetivas.

No primeiro caso, do líder espera-se que saiba expressar a necessidade de agir, construindo uma proposta muito persuasiva de sustentabilidade, clara e vigorosamente fundamentada no negócio — o desafio de inserir o tema no core business é hoje, como se sabe, um dos mais importantes. Requer-se da liderança que tenha a capacidade de convocar a colaboração das partes interessadas para a mudança. No segundo, é desejável que consiga converter compromissos em um programa plausível de mudanças, com iniciativas e metas econômicas, sociais e ambientais inseridas no planejamento dos negócios. Precisa ser capaz de convencer que sustentabilidade traz resultados e representa uma vantagem competitiva. Aqui, referimo-nos não apenas ao CEO – embora dele se espere sempre engajamento exemplar -, mas a todos os líderes responsáveis por executar as políticas da empresa.

Não foram poucos os que, por exemplo, resistiram às ideias de Héctor Núñez quando, em 2006, orientado pelo planejamento da matriz do Walmart, nos EUA, começou a implantar as plataformas e os gates específicos, e a criar comitês internos, com o objetivo de realizar metas ambiciosas de sustentabilidade na operação brasileira da grande varejista global.  “No caso do Walmart, inserir a sustentabilidade no modelo de negócio exigiu a implantação de um programa holístico que captura as causas e efeitos, possibilitando atacar de maneira direta os fatos sob nosso controle e influenciar nossos parceiros. Em tudo que fazemos e pensamos, a sustentabilidade se incorpora ao negócio. As ações – vale dizer – constam das margens, estão nos lucros, foram devidamente planejadas para integrar o business. Não constituem iniciativas isoladas, projetos com começo, meio e fim, nem custos adicionais. Essa foi a parte mais difícil. No momento em que os colaboradores enxergaram a incorporação efetiva ao negócio, a conversa deslanchou”, lembra o ex-principal executivo do varejista no Brasil, no capítulo As convicções do intrépido Capitão Água.

Ante argumentos filosóficos, ideológicos, organizacionais, mercadológicos ou operacionais, os presidentes entrevistados tiveram de lidar com o contraditório e até mesmo com a oposição –aberta ou camuflada – daqueles que enxergavam uma ameaça em suas propostas ou ainda uma ofensa à lógica predominante, inercial, mais segura e confortável. Sem abrir mão de suas convicções, conscientes dos obstáculos culturais para a aceitação do “novo”, enfrentaram a descrença alheia com serenidade e uma inabalável habilidade de convencimento. Nos depoimentos, emergiram sempre exemplos de firmeza na condução da implantação da sustentabilidade. Mas também de paciência para aceitar o tempo de incorporação dos novos paradigmas.

Não foi uma tarefa simples para Fábio Barbosa, no final dos anos 90, convencer os acionistas holandeses do ABN Amro Bank sobre a validade estratégica da medida de recusar empréstimos para empresas desmatadoras da Amazônia ou envolvidas em negócios controversos do ponto de vista socioambiental. Isso tudo antes dos Princípios do Equador.  Critérios de sustentabilidade – afinal de contas – não estavam no protocolo de negócios e pareciam excessivamente românticos num mercado com regras totalmente fundadas na lógica contábil-financeira.

Também não foi menos complexo – nem tem sido – para Kees Kruythoff, presidente da Unilever, envolver uma legião de funcionários nas jornadas de planejamento, internalizar as estratégias a partir da Teoria U, idealizada por Otto Scharmer, e energizá-los no esforço de a companhia dobrar de tamanho, até 2012, sem aumentar seus impactos ambientais. Como nunca foi linear, muito menos sem ranhuras, o caminho adotado por Núñez de convencer presidentes de empresas fabricantes de produtos de consumo a desenvolver embalagens e produtos mais sustentáveis.

Em comum, os presidentes entrevistados enfrentaram as duas etapas propostas por Lueneburger e Goleman. Lideraram processos para colocar a sustentabilidade no coração do negócio, aceitaram a incorporação dos custos das externalidades e superaram dilemas nem sempre tão simples de resolver como, por exemplo, o que opõe as lógicas de resultados de curto e longo prazo, de single bottom line versus triple bottom line.

4- A sustentabilidade vista sob a ótica da oportunidade

A terceira fase proposta por Lueneburger e Goleman refere-se à expansão de fronteiras.  No artigo A Sustentabilidade Exige Mudanças na Liderança, a dupla de pensadores afirma que, nessa etapa, impõe-se ao líder avaliar as tendências de sustentabilidade associadas ao seu negócio, identificando novas oportunidades, reposicionando a empresa para tirar proveito delas, e estabelecendo relações mais próximas com as partes interessadas.

Os entrevistados de Conversas com Líderes Sustentáveis formam grupo que Wayne Visser (autor de Making a Diference, sem tradução para o português), definiu como de “facilitadores e catalisadores.” Admiram a ideia de estar com pessoas, respeitam os ritmos específicos de aceitação da mudança, entusiasmam-se em conquistar a adesão e são exímios “criadores” de cultura.  “Como são as pessoas que fazem a mudança na construção de modelos mais sustentáveis de negócio, os líderes devem gostar de gente. Precisam estimular a inovação, ensinar a  correr riscos, motivar, lidar com o antagonismo. Essa é uma das competências que considero essenciais a um líder e que venho procurando desenvolver ao longo do tempo”, afirmou José Luciano Penido, presidente do Conselho de Administração da Fibria, no capítulo Aprendendo a lidar com o antagonismo.

Os líderes “facilitadores” estão mais próximos da figura dos “jardineiros” dedicados — como bem disse Luiz Ernesto Gemignani, da Promon – do que da dos “comandantes”, cuja autoridade se apoia na força, no poder formal e no dedo em riste do velho binômio do comando-controle. Eles nunca impõem. Dedicam-se a seduzir, conquistar as vontades. Jamais manipulam. Preferem orientar e educar seus liderados, com uma compreensão muito clara de que suas responsabilidades excedem à do próprio negócio.

Quase sempre visionários e analistas argutos de tendências, entenderam bem antes do que a média dos demais líderes o fato de que não há outro caminho senão inserir a sustentabilidade no coração do negócio. E a essa tarefa se dedicam com energia descomunal, colocando o tema entre as suas prioridades pessoais e também as da companhia. Definem suas escolhas de negócios e mercados baseados também nos critérios socioambientais. “Na prática, são frequentes as situações em que nos recusamos a desenvolver o projeto se a escolha tecnológica do cliente não for a que entendermos correta. Felizmente ainda mais frequentes vêm sendo as situações em que o cliente se mostra aberto e sensível aos nossos argumentos pela escolha tecnológica ideal“, disse Gemignani no capítulo O formador de líderes jardineiros.

5- Capacidade de dialogar, comunicar ideias e propósitos, envolver colaboradores e identificar sinergias

Os presidentes em sustentabilidade retratados em Conversas com Líderes Sustentáveis têm em comum pelo menos um dos 11 modelos mentais sugeridos por John Naisbitt em seu livro O Líder do Futuro (2007). Eles compreendem o poder que existe em não se estar sempre certo. Por esse motivo nunca dispõem das respostas prontas. Preferem construí-las em sistema de colaboração com os funcionários, fornecedores, clientes, comunidades e organizações do governo e da sociedade civil.  São praticantes, por princípio, de relações menos verticais e menos hierarquizadas.

A competência da escuta ativa é um de suas marcas pessoais mais destacadas. Foi ouvindo, por exemplo, líderes da comunidade de Juruti, no Pará, que Franklin Feder, presidente da Alcoa, começou a refletir sobre os impactos da operação da companhia na região, redefinindo as diretrizes do famoso projeto Juruti Sustentável.  “Partimos para esse empreendimento sabendo pouca coisa a respeito da realidade da região. Aprendemos um pouco mais todos os dias. Erramos muito também. E mudamos caminhos para alcançar o equilíbrio entre o que a empresa deseja e o que é bom para as pessoas e o meio ambiente. (…) Isso só ocorreu porque optamos por dialogar, estabelecer canal de comunicação e engajar stakeholders desde o inicio”, admitiu no capítulo Um líder de ouvido atento.

Conversando com as pessoas que convivem com esses líderes, constatamos que são comunicadores habilidosos. Cada qual a seu modo – uns mais expansivos, outros mais tímidos –, eles entenderam que a comunicação faz toda a diferença na tarefa de despertar interesse, circular ideias, conquistar a adesão dos públicos de interesse e fomentar cultura. Regra geral, destinam tempo proporcionalmente relevante para ouvir colaboradores, realizar encontros com fornecedores, conversar com líderes de comunidades, atender clientes, costurar parcerias estratégicas, frequentar seminários e falar em fóruns temáticos. São porta-vozes do tema, uns mais outros menos ativistas.

Em seus discursos, utilizam a mensagem da sustentabilidade de modo claro, objetivo e entusiasmado. Preferem uma linguagem simples e direta, a fim de eliminar o risco de eventuais dúvidas sobre o que pensam e como desejam ver a empresa em relação ao tema. Não raro, adotam uma bandeira de sustentabilidade relacionada com o negócio da empresa em torno da qual estruturam imagem de competência ilibada e reputação de liderança altamente compromissada. É o caso de José Luiz Alquéres, ex-presidente da Ligth, estudioso dos dilemas urbanos e defensor da ideia de que as cidades devem ser menos energívoras. “(…) Precisamos, com urgência, instalar um novo paradigma de modelo de vida urbano centrado numa economia de baixo carbono. Logo, na condição de líder, minhas preocupações não devem se limitar a ter lâmpadas econômicas no prédio da sede da companhia. Isso é importante, claro. Mas não suficiente. Tenho a obrigação de olhar o todo do negócio. Preciso usar minha capacidade de ação para reduzir impactos de forma a fazer diferença para a humanidade”, disse Alquéres , no capítulo Um líder por cidades menos energívoras.

Em nome do melhor cumprimento da tarefa de comunicar ideias de sustentabilidade, alguns líderes lançam mão de estratégias, no mínimo inusitadas, como a de Núñez, ex-Walmart. Para sensibilizar os funcionários, tocando-os de perto, o executivo incorporou o Capitão Água, um super-herói paladino dos conceitos de economia de recursos naturais e do consumo consciente. Ouvir, comunicar, envolver e engajar são ações cotidianas para esses líderes de sustentabilidade.

O líder em sustentabilidade e suas 20 atribuições

Pensando em oferecer um “caminho das pedras” para empresas que querem refletir sobre o tema, o Pacto Global da ONU lançou, em 24 de junho de 2010, um Plano para Liderança em Sustentabilidade. Sua intenção foi criar uma espécie de modelo de atuação para as empresas signatárias, contribuindo assim para desenvolver capacidades, habilidades e recursos. Na introdução do documento, a entidade reconhece que, embora existam mais presidentes de corporações liderando a agenda da sustentabilidade, o conceito ainda “não penetrou na maioria das empresas que operam nos mercados em todo o mundo”. Leitura bastante adequada, com a qual concordamos.

Ao longo de sua experiência de 10 anos, o Pacto Global afirma ter aprendido duas lições importantes. Primeira, que o alto desempenho em sustentabilidade das empresas líderes constitui a mais abundante fonte de inspiração para aquelas que “se encontram nos degraus mais baixos da pirâmide da sustentabilidade.” Segunda, que os atuais desafios globais – de clima, água, paz e biodiversidade – exigem novo patamar de desempenho para as companhias que desejam “efetivamente cumprir a promessa da sustentabilidade.”

Objeto de longas discussões com as empresas signatárias e suas partes interessadas, órgãos das Nações Unidas e especialistas, o plano se estrutura em três dimensões – implantação dos 10 Princípios  em estratégias e operações de negócios; apoio das empresas às questões e objetivos mais amplos da ONU – como, por exemplo, Paz e Segurança, Ecossistemas Sustentáveis e Biodiversidade, Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas, Segurança Hídrica e Saneamento; e engajamento ao Pacto Global, por meio da formação de redes, grupos de trabalho locais e globais, e iniciativas setoriais e temáticas.

Na intersecção dessas três dimensões, o Pacto Global identificou o que classifica como “componentes transversais”. Eles são quatro. O compromisso dos líderes empresariais abre a lista.

De acordo com o modelo proposto, o principal executivo deve “fazer declarações públicas claras e demonstrar liderança pessoal em sustentabilidade”. É seu papel também promover iniciativas para ampliar o debate do conceito no setor de atuação, além de comandar o desenvolvimento de normas setoriais específicas. Espera-se ainda que ele lidere uma diretoria ou um grupo de executivos na condução da estratégia de sustentabilidade empresarial, estabelecendo objetivos firmes e cuidando pessoalmente de sua implementação. Recomenda, por último, que o líder número 1 inclua os critérios de sustentabilidade – e os princípios do Pacto Global – nos grandes objetivos e nos sistemas de incentivo para a presidência e a diretoria.

Analisando livremente o modelo proposto pelo Pacto Global da ONU, extraímos as seguintes 20 atribuições para o líder em sustentabilidade:

1- Comandar a elaboração de uma estratégia consistente de sustentabilidade, buscando a cooperação entre as diferentes áreas e as questões mais relevantes para o negócio e o seu setor de atuação; fazer com que o conceito permeie a cultura organizacional, transformando-o em um valor corporativo relevante para a definição da identidade da companhia;

2- Garantir a coordenação entre os diversos departamentos da empresa, com o objetivo de maximizar o desempenho em sustentabilidade;

3- Avaliar riscos e oportunidades relacionados a questões de sustentabilidade para a empresa e o setor;

4- Identificar todos os impactos socioambientais causados pelas operações da empresa; cuidar para minimizá-los ou eliminá-los;

5- Definir políticas e cenários para o futuro, estabelecendo metas mensuráveis;

6- Envolver e educar funcionários e colaboradores, adotando programas de desenvolvimento, e também sistemas de incentivo;

7- Monitorar e mensurar desempenho com base em métricas para, por exemplo, gestão de água, energia, emissões de gases de efeito estufa, poluição, efluentes e biodiversidade;

8- Responsabilizar, pela execução da estratégia, áreas corporativas essenciais como Compras, Marketing, Recursos Humanos, Jurídico e Relações Institucionais, assegurando que nenhuma delas atue em conflito com os compromissos e objetivos de sustentabilidade;

9- Alinhar estratégias, metas e estruturas de incentivo de todos os departamentos e unidades com os objetivos e compromissos de sustentabilidade da empresa;

10- Analisar cada elo da cadeia de valor, mapeando impactos, riscos e oportunidades;

11- Envolver fornecedores na estratégia de sustentabilidade; sensibilizar, treinar e capacitar parceiros de negócio; monitorar o quanto estão alinhados com os compromissos e práticas da empresa;

12- Desenvolver produtos e serviços ou conceber modelos de negócio que contribuam para promover a sustentabilidade;

13- Realizar investimento social alinhado com as competências da empresa e o contexto operacional de seu negócio;

14- Integrar campanhas e iniciativas públicas, assumindo, em suas comunicações, compromissos com as questões mais relevantes de sustentabilidade;

15- Coordenar esforços com outras organizações para potencializar investimentos, e não se sobrepor a iniciativas de desenvolvimento sustentável;

16- Cooperar com organizações do mesmo setor em ações que ajudem a encontrar respostas para desafios comuns;

17- Fazer o papel de mentor para empresas do mesmo ou de outro setor que ainda se encontrem em estágio inicial de implantação de práticas sustentáveis; na condição de referência em liderança em sustentabilidade, facilitar o acesso a informações por parte daqueles que desejam conhecer a política da empresa;

18- Comunicar os resultados e a evolução de suas práticas de sustentabilidade, visando prestar contas às partes interessadas e à sociedade;

19- Envolver e educar os stakeholders para que eles conheçam as políticas da empresa e participem delas;

20- Capitanear o processo de mudança, inserir as dimensões social e ambiental na noção de sucesso empresarial, estabelecer uma visão e uma missão de sustentabilidade.

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