Uma década de sustentabilidade

Uma década de sustentabilidade

No ano passado, o CEBDS (Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) completou dez anos de vida. Em 2008, o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social chega à mesma idade. A considerar que essas organizações foram pioneiras em seus campos de atuação, não é impreciso afirmar que a discussão sobre a sustentabilidade nos negócios tem uma década no Brasil.
A primeira organização, braço brasileiro do WBCSD (World Business Council for Sustainable Development), tem quase 70 associados, entre grandes corporações que respondem por 30% do PIB do País. Nasceu para disseminar a idéia de que os negócios podem e devem ser ambientalmente sustentáveis. A segunda reúne, como associados, 1332 empresas de diferentes portes, que empregam dois milhões de pessoas e contribuem para 35% do PIB. Sua missão é mobilizar, sensibilizar e apoiar as empresas a gerirem seus negócios de um modo socialmente responsável.
Além de pertencerem à mesma “geração”, ambas apresentam em comum a crença na idéia de que não há melhor caminho do que as empresas produzirem riqueza com justiça social e respeito ao meio ambiente. E embora tenham escolhido estradas diferentes (a ambiental e a social) para chegar ao mesmo destino, suas agendas, desde sempre  sinérgicas, se encontram agora, ao final de uma década, no vértice do conceito de sustentabilidade e da lógica do triple bottom line. Graças à sua capacidade de persuasão, um tema antes marginal foi parar na mesa dos presidentes de empresas e virou matéria de planejamento estratégico.
Encerrado o ciclo do primeiro decênio, cabe um balanço e uma projeção futura dos próximos desafios. Vamos aos avanços. Seria muita má vontade não reconhecê-los. Até a metade dos anos 1990, as empresas brasileiras eram, em sua maioria, como ilhas auto-governadas exclusivamente pelos interesses dos donos/acionistas, referenciadas na ética egoísta do lucro acima de qualquer coisa e limitadas por um conjunto de responsabilidades, algumas impostas pelo dever de obediência a legislações (do trabalho, do consumidor, do meio ambiente, da concorrência) outras consentidas por conveniência do negócio (economia de recursos, eficiência de processos, atração e retenção de talentos, qualidade de produtos e eficácia nos serviços a clientes).
Para a maioria delas, o relacionamento com stakeholders se limitava a relatórios contábeis para acionistas, uma comunicação correta para funcionários, um serviço de atendimento aos consumidores e, eventualmente, uma ação de relações públicas com a comunidade do entorno, quase sempre baseada em receita filantrópica. Antes acessória, esta tarefa tornou-se estratégica. Mais do que prestar contas ou manter política de boa vizinhança, este contato pressupõe hoje interação, diálogo permanente, incorporação de expectativas das partes interessadas na gestão do negócio. O cenário de relações ficou mais complexo e a lista de stakeholders cresceu, incluindo também governos, organizações da sociedade civil, parceiros da cadeia produtiva e toda a sociedade. Os acionistas passaram a ser informados por meio de balanços socioambientais, os consumidores ganharam ouvidorias, os colaboradores receberam ambientes melhores de trabalho, códigos de ética, políticas de valorização da diversidade (gênero, étnica, etária e por deficiência). Antes tidas como entidades desconfiadas, que se devia controlar mediante a doação de dinheiro de pouca monta, as comunidades começaram a ser vistas como protagonistas do mesmo processo de desenvolvimento. Conceitos nada comuns no mundo dos negócios, como inclusão, geração de renda, redução de desigualdades e desenvolvimento sustentável passaram a integrar o discurso de líderes empresariais e a ação cotidiana das corporações.
Até uma década atrás, a empresa julgava que sua responsabilidade se encerrava com a fabricação do produto. Eram exceções as que se preocupavam, por exemplo, com o descarte responsável no pós-consumo, com a existência de trabalho escravo, indigno ou infantil em algum ponto de sua cadeia de fornecedores ou com o quanto de energia, recursos naturais e matéria prima esgotável seria necessário utilizar no processo de produção. Poucas efetivamente demonstravam preocupação com transparência e governança. Hoje muitas possuem reservas florestais próprias, reutilizam materiais, controlam emissão de carbono, estabelecem pactos contra a corrupção e o desmatamento da Amazônia, fazem coleta seletiva e dão preferência a pequenos fornecedores de comunidade.
Pode-se discutir se a motivação nasceu da convicção no conceito ou da conveniência de atender às pressões de consumidores e mercados cada vez mais seletivos. O fato é que houve avanços, sem dúvida. E ainda que tudo isso não seja uma regra para o conjunto das empresas, já é prática relativamente comum entre as maiores e melhores, justamente as determinam as tendências dos mercados.
O que esperar do futuro? Levando-se em conta o atual movimento, os próximos dez anos deverão ser marcados muito provavelmente por um esforço das empresas em pesquisa e desenvolvimento de produtos com apelo socioambiental, por ações permanentes de engajamento dos parceiros de cadeia produtiva, pela redução drástica de emissões, pela incorporação de ferramentas gerenciais compatíveis com as demandas de sustentabilidade, pelo estudo e aplicação de novas formas de energia, pela atuação em rede com novos stakeholders que surgirão à frente e pela educação de colaboradores para identificação de oportunidades.
Resta saber como as empresas enfrentarão o mais central de todos os impasses: produzir e consumir mais num planeta que já dá sinais claros que não suportará os atuais modelos de produção e consumo.

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