Uso e gestão de energia

Uso e gestão de energia

Uso e gestão de energia: uma visão realista

Por José Goldemberg

Os desafios que as empresas enfrentarão na década que se inicia dizem respeito à garantia de suprimento de eletricidade. O de petróleo e derivados não apresenta maiores problema: o Brasil já é hoje autossuficiente nessa área e o aumento necessário da produção nos campos petrolíferos da plataforma continental (incluindo o pré-sal) parece assegurado. O problema reside na eletricidade.

Os maiores desafios, na minha avaliação, estão, sobretudo, na falta de eletricidade para atender às necessidades de um País em crescimento, como ocorreu em 2001/2002; no fato de que a geração de eletricidade poluente criaria problemas para a saúde e o conforto da população; e nos problemas na rede de transmissão, origem de blackouts frequentes.

O planejamento energético que os órgãos do Ministério de Minas e Energia faz é muito simplista e parte da hipótese de que o consumo de energia crescerá tanto quanto o produto bruto nacional (cerca de 5% ao ano, na próxima década). Aceitando essa hipótese, haverá uma demanda de mais de 50% de energia, seja de petróleo ou eletricidade.

Em 2010, foram produzidos cerca de 112.000 megawatts, dos quais 74% em grandes hidrelétricas. O restante veio do gás natural, energia de biomassa (principalmente bagaço de cana-de-açúcar), pequenas centrais hidrelétricas, energia nuclear e energia eólica. O crescimento previsto sinaliza que, em 2019, serão necessários cerca de 167.000 megawatts, um aumento de 49%. O mais razoável seria a expansão da geração hidrelétrica, já que apenas um terço desse potencial brasileiro foi explorado. Sucede que a maioria das expansões previstas deve ocorrer na Amazônia, onde problemas ambientais podem atrasar os projetos ou até inviabilizá-los. Daí o perigo de desabastecimento de eletricidade, como ocorreu em 2001, quando o regime de chuvas nos anos anteriores foi desfavorável.

Por essa razão, o governo planeja ampliar a produção de energia térmica (gás e óleo combustível) e nuclear. Com isso, a participação térmica deve aumentar substancialmente, criando problemas de natureza ambiental tanto em nível local (emissões de óxidos de enxofre e material particulado) como global (emissões de gases de efeito estufa, principalmente CO2 – dióxido de carbono). Energia nuclear não emite esses gases, mas suscita outros problemas, ilustrados pelo que aconteceu nos reatores nucleares no Japão.

Contempla-se também, nas projeções da Empresa de Planejamento Energético, a expansão do uso de energia eólica e biomassa (principalmente usando bagaço de cana), apesar desse planejamento subestimar a contribuição da geração de eletricidade usando bagaço, que poderia ser muito maior. Contudo, todas as projeções são feitas do ponto de vista do suprimento e não do consumo. As previsões existentes não consideram praticamente o fato de que as tecnologias de utilização da energia estão evoluindo muito e a eficiência com que se faz uso dela tem aumentado significativamente. Uma lâmpada fluorescente moderna ilumina tanto (ou mais) quanto uma lâmpada antiga com filamento de tungstênio, mas consome apenas um terço da eletricidade. Algo semelhante ocorre com outros equipamentos, desde geladeiras até automóveis.

Se essa dimensão for incorporada ao planejamento energético, o consumo de energia não precisará crescer 5% ao ano (se o aumento do Produto Interno Bruto for de 5% ao ano). Com isso, a solução dos problemas ambientais e do suprimento de energia ficará muito mais fácil de se resolver, como já ocorreu em todos os países industrializados.

José Goldemberg é físico especializado em produção de energia e um dos principais cientistas brasileiros. Foi reitor da Universidade de São Paulo (USP), onde permanece como professor

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